Quando criança, um dos meus maiores sonhos era ter uma bateria. Além do alto preço, minha mãe não me permitiu ter uma pois sabia que eu tornaria aquela casa um inferno tocando por horas. Cresci sem sequer saber tocar instrumento algum, mas até hoje considero a bateria o instrumento mais importante de um conjunto, além de achar o baterista o cara mais cool.
No cinema, a história é diferente. Que eu me lembre, o único baterista que tem a história centrada em si é no clássico The Wonders - O Sonho não Acabou e ele ainda divide alguns momentos com outros integrantes.
Whiplash - Em Busca da Perfeição foge desses parâmetros. Primeiro que o filme não tem como pano de fundo uma banda de rock. Segundo que o filme é totalmente voltado para o jovem Neyman (Milles Teller), um garoto de 19 anos talentoso, que estuda num dos melhores conservatórios do país e consegue o posto de baterista suplente na principal banda da escola, comandada pelo rígido maestro Terence Fletcher (J.K. Simmons)
Neyman quer se tornar uma lenda na bateria e tem como seu principal ídolo Buddy Rich, eleito ano passado pela revista Modern Drummer o mais completo de todos os tempos. Mas para isso, sabe que além de praticar muito, precisa lidar com o temperamento de seu professor impetuoso.
O argumento do filme é interessante. O filme trata de um assunto que abrange não só a música, mas boa parte das profissões hoje em dia: Até onde vai uma pessoa para conseguir realizar seu sonho? E qual é o limite de um mentor ao buscar extrair o máximo de seu aluno?
Duas perguntas subjetivas que ditam o ritmo do filme. Neyman tenta a qualquer custo seguir seu sonho e Fletcher faz o mesmo na tentativa de conseguir formar o novo Charlie Parker. O professor exige o máximo (mentalmente e fisicamente) e segue a premissa de que dizer "bom trabalho" a alguém o prejudica.
Se alguém acha as atitudes do maestro um tanto quanto exageradas, é recomendável procurar um pouco sobre as atitudes de Steve Jobs dentro da Apple. O inventor e empresário era absurdamente exigente e há relatos de ex-funcionários que alegam terem sido humilhados por ele. Se os métodos funcionam ou não é difícil dizer, mas não a toa, a empresa é uma das maiores da atualidade.
Damien Chazelle faz o seu melhor trabalho na carreira, mas deixa a desejar no roteiro. Não que seja fraco ou algo assim, mas ao fim do filme, o espectador pode ter a impressão de que faltou algo. Uma cereja do bolo ou algo assim. Uma sensação de coito interrompido, melhor dizendo. Além disso, apesar das relações fora da música de Neyman serem determinantes para o desfecho, muitas delas aparecem um pouco superficiais. Nos sentimos dentro do filme apenas nas sequências musicais. Precisava ser mais humano.
Apesar disso, seu trabalho na direção é impecável, principalmente na última cena do filme. Essa é responsável por torná-lo ainda mais eficiente. O diretor, assim como seus personagens, tenta extrair o que há de melhor em si para dirigir seus personagens e as boas sequências.
O show de atuações fica mesmo entre o protagonista e (talvez) antagonista. Miles Teller faz ótimo trabalho no papel de Neyman e é uma pena não ter sua presença no Oscar. O jovem ator já mostrou ser promissor e já possui alguns projetos interessantes no futuro, como o papel de Sr. Fantástico em Quarteto Fantástico.
Já J.K. Simmons é o grande destaque desta trama. Seu papel pode não exigir muita preparação, mas ainda assim é necessário um bom laboratório para encarnar a personagem como ele fez. Embora não seja o favorito, se levar o Oscar de Melhor Ator Coadjuvante não será surpresa alguma.
Com ótima trilha sonora, excelente direção, boas atuações e uma sequência final de tirar o fôlego, Whiplash - Em Busca da Perfeição é feito para os amantes de música e para aqueles que buscam seguir algum sonho. Seu único defeito é parecer superficial em alguns quesitos. Chazelle consegue mostrar a obsessão em dois pontos de vista distintos, porém paralelos com eficácia. No entanto, deixar seus efeitos colaterais um pouco fora do cenário principal o torna morno. Na escola Aronofsky de filmes sobre obsessões, Damien Chazelle precisa fazer assim como seu protagonista: praticar mais em busca da perfeição.

