"Siga em frente, olhe para o lado. Se liga no mestiço da batida do cavaco"
Capitão América, Fofão, Mickey, Popeye e um palhaço. Não, não é a nova formação dos Vingadores, estamos falando de um dos fenômenos atuais da internet: A Carreta Furacão, um daqueles trenzinhos de interior, mais precisamente de Ribeirão Preto que viralizou após um vídeo publicado em meados de 2010 e hoje conta com mais de 3 milhões de visualizações.
O sucesso é tanto que já existem até mesmo movimentos no país todo para que haja uma turnê de apresentação do grupo. Em Florianópolis, por exemplo, a presença já está confirmada (notícia aqui). Em São Paulo há mais de 30 mil pessoas presentes no evento que pede a vinda deles. Agora, há um documentário em desenvolvimento, o "Rebolão, mas sua Irmã Gosta".
Antes mesmo deste hype todo, o diretor Gabriel Dias viu o tal vídeo e passou a se interessar mais pelo assunto. "Eu percebi que além do 'Trenzinho Carreta Furacão', haviam outros vídeos, fotos e páginas no Facebook relacionados a trenzinhos - não mais infantis ou turísticos - e se tratava uma movimentação maior do que parecia inicialmente", diz. Foi aí que ele começou a elaborar melhor a ideia e, em 2014 resolveu desenterrar o projeto e tentar alavancar como um filme de TCC de seu curso, Bacharelado de Audiovisual. "Formei a equipe e aos poucos todo mundo se integrou bastante e começamos a trabalhar de verdade. Muita gente não entendia porque estávamos fazendo um filme especificamente sobre aquilo, mas os resultados provaram que não erramos."
Segundo o diretor, que também é roteirista e editor, a ideia do filme é tirar esse estigma de "meme" dos trenzinhos e mostrar que há muito mais coisas envolvidas nesse universo do que as pessoas imaginam.
Confira a entrevista que fizemos com o Gabriel e a produtora do documentário, Gabriela Dias na íntegra:
Sala Sete: Porque fazer sobre as carretas? Qual o objetivo, o conceito?
Gabriel: Eu gosto muito de misturas de culturas mais tradicionais com cultura popular. Eu vi que as carretas das cidades do interior de Minas Gerais misturavam os elementos dos trenzinhos tradicionais infantis e de turismo, mas que já tinham um outro apelo com a música, na maneira de sair na rua e principalmente em como os meninos se identificavam com aquilo. Os trenzinhos deixaram de ser um passeio para crianças pequenas e se tornaram parte de uma subcultura muito única que podemos relacionar com tantas outras que acontecem nas ruas, é importante pra mim.
Foto: Divulgação |
Inicialmente eu e o Miguel (Direção de Som, Roteiro e Edição) procuramos muitas referências textuais sobre festas, cultura popular, tribos urbanas com ajuda do nosso orientador e outros professores. Continuamos acessando diversos vídeos, fotos e páginas de trenzinhos, mas percebemos que para o trabalho continuar fluindo em um ritmo legal, precisaríamos fazer uma pesquisa de campo ou não teríamos resultados. Fomos para Ribeirão Preto sem muitas informações, pois apesar de ser uma cidade grande, eles não usam tanto para comunicação a nível global, estão acostumados a usar para contato entre pessoas que já se conhecem pessoalmente.
Conforme fomos encontrando trenzinhos, ou entrando em contato por telefone, a maioria das pessoas ficaram assustadas, não entendiam porque queríamos gravá-los e qual o objetivo em fazer um filme sobre eles. Quando voltamos das outras vezes com a Mayra (Assistente de Direção e Produção Executiva), a Gabriela (Direção de Produção e Direção de Arte) e o Arthuro (Direção de Fotografia e Correção de Cor), os meninos foram se soltando mais e confiando na gente, houve um trabalho muito bacana de articulação com a produção, até hoje alguns falam conosco.
Depois dessa etapa começamos a pensar muito nas gravações e em que estrutura queríamos para o filme, o que era realmente importante e forte de retratar, é um universo muito rico.
Vocês estão focando mais em Ribeirão Preto, mas chegaram a entrar em contato com outras carretas em outras cidade para filmar?
Acabamos ficando em Ribeirão Preto mesmo. Como a movimentação de trenzinhos lá é grande, achamos que ela representaria bem as cidades em volta.
Vocês já colheram todo o material? Como foi o processo de filmagem?
Gabriela: Gravamos entre julho e outubro de 2015. Todos do grupo são de São Paulo e trabalham, o que dificultava a programação das viagens e, principalmente, uma viagem longa, o que seria o ideal. A faculdade ajudou com os equipamentos mas as viagens e alimentação saíram do nosso bolso. Fizemos três viagens de 4 dias cada aproximadamente. O ideal seria se conseguíssemos ficar mais tempo lá, mas tudo tem seus problemas, né? O processo foi bem desafiador, era um universo muito rico e novo, em alguns dias conseguíamos captar muita coisa legal, em outros acontecia bem menos do que prevíamos, sorte é um elemento bem presente no documentário.
Qual foi a maior dificuldade?
Acho que uma das maiores dificuldade foi encaixar tudo o que queríamos gravar no pouco tempo que tivemos lá dentro, e a agenda da produção tinha que estar sempre aberta para mudanças repentinas. Estruturar o filme e editar tudo também não foi nada fácil. Por isso apesar de já termos apresentado o TCC, estamos retrabalhando a montagem, pra ficar mais bacana!
No seu processo de pesquisa, há alguma análise de qual o cenário atual destas carretas no interior?
É difícil traçar um panorama geral sem generalizar. Algumas cidades parece que já tem legislações voltadas aos trenzinhos, em outras a maioria ainda é mal visto por muita gente, ou simplesmente ignorado. Qual o melhor dos cenários? Não sei dizer.
Foto: Divulgação |
Você chegou a falar com os integrantes, claro. Como eles veem esse buzz da internet?
Olha, muitos dos que aparecem no vídeo do Trenzinho Carreta Furacão nem dançam mais. Eles usam um pouco de forma propagandística até porque o trenzinho apareceu no Programa da Eliana e no Pânico na TV, mas pro pessoal da cidade tanto faz. Um trenzinho não é mais prestigiado que o outro por isso.
Como vivem os integrantes, as pessoas por trás das carretas? Elas levam a sério como profissão? (é uma profissão?)
Gabriela: Os meninos dançam porque realmente gostam daquilo, é a paixão deles. Lá eles ficam famosinhos, atraem mulher e, claro, se divertem com os amigos.
Eles entenderam a proposta do documentário?
Inicialmente não. Com o tempo acho que eles foram se reconhecendo como algo único e diferente e sacaram o que estávamos fazendo.
Como foi a repercussão do projeto na cidade, ou bairro?
Gabriela: Depois das primeiras viagens já éramos conhecidos por lá! Os meninos vinham falar com a gente "Por que não gravaram com tal trenzinho?", "Eu vi que tiraram foto com aquele trenzinho e o nosso não".
Gabriel: Alguns trenzinhos e meninos gostaram bastante de gravar com a gente. Estamos começando a ver a repercussão agora que saiu o trailer, parece que estão comentando bastante até, mas é muito cedo pra dizer algo concreto.
Há patrocínio?
Gabriela: Não. Os equipamentos que utilizamos eram quase todos da faculdade, o resto foi pago do nosso bolso. Gostaríamos de patrocínio pra poder faze uma exibição legal.
Foto: Divulgação |
Há interesse em projetar o filme para qual público?
Temos interesse em projetar o filme para todos os públicos interessados! Sei que é um comentário aparentemente genérico, porém, acho que o "Rebolão!" é um filme que pode se estender a todos, qualquer pessoa pode se interessar pelo filme, uma vez que nosso objeto de estudo é muito rico e novo para quem não vive em cidades com esses tipos de trenzinho e ao mesmo tempo é bom para jovens que se veem representado nisso.
Você acredita que pelo buzz gerado na internet o público possa se interessar a ponto de ir ao cinema?
Não sei se esse filme vai passar em algum cinema. Não temos interesse por circuitos comerciais, não é a ideia do filme lucrar com tudo isso. Faremos eventuais exibições em lugares interessados em exibir e descobriremos. Espero que as pessoas saiam de casa sim.
Há uma data de estreia?
Ainda não. Estamos finalizando o processo de edição e finalização de pós-produção. Pretendemos levar o filme para Ribeirão Preto e fazer uma exibição aberta para que todos os que participaram e interessados possam assistir, uma espécie de 'première' mesmo, e depois exibir em qualquer lugar que esteja aberto para nos receber, dentro ou fora de São Paulo. Não podemos colocar no Youtube assim que ficar pronto porque senão o filme não pode entrar em festivais, mas assim que esse período passar disponibilizaremos para que todos possam assistir.
Para conferir mais sobre o "Rebolão, mas sua irmã gosta", basta entrar na página do Facebook do documentário
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