A Formula Um é um esporte muito conhecido por ter rivalidades marcantes. Ao longo dos anos, houve duelos épicos entre Ayrton Senna e Alain Prost, Nelson Piquet e Nigel Mansell, Gilles Villeneuve e Didier Pironi, e por que não mais atual Fernando Alonso e Lewis Hamilton?
Todas elas provavelmente dariam um filme sobre o assunto, mas o diretor Ron Howard escolheu 1976, a era romântica da F1 em que tudo de mais improvável aconteceu.
Rush - No Limite da Emoção conta a história de um dos duelos mais marcantes do esporte: James Hunt, piloto playboy e inconsequente, e Niki Lauda, piloto introvertido e metódico. Duas personalidades completamente opostas, que possuíam a mesma gana e o desejo de conquistar o título da temporada daquele ano.
O filme acerta em cheio em transcender a empatia de quem ama automobilismo e, ao mesmo tempo capaz de chamar a atenção daquele que nunca sequer ouviu falar a palavra paddock. A película cativa por não apenas retratar a rivalidade dentro das pistas, mas por tentar apresentar a personalidade de cada um nos pequenos detalhes de maneira igual, sem cometer a injustiça de priorizar algum deles ou fazer algo como bandido e mocinho. O espectador acaba não torcendo para ninguém ou torce pelos dois ao mesmo tempo.
No início, somos apresentados ao bon vivant, James Hunt de forma categórica e que dita o que veremos dele na maioria das cenas: Mulheres, carros, bebidas e drogas, acreditando que a graça de ser um vencedor está no proveito que se tira disso. Um modo de vida para fazer qualquer rock star sentir inveja. Ainda na primeira metade, conhecemos também Niki Lauda, o piloto perfeccionista pedante, porém um gênio da manutenção de seus próprios carros e que possui um talento nato nas pistas. Dali em diante, somos direcionados ao fatídico Campeonato Mundial de Formula Um de 1976, ano em que os dois conseguem se enfrentar de igual para igual em busca do título, Lauda pela Ferrari, Hunt pela McClaren recém-deixada por Emerson Fittipaldi. E é ali onde o restante do filme acontece.
Ron Howard, diretor renomado, responsável por filmes como Uma Mente Brilhante e Frost/Nixon deixa claro que está disposto a utilizar tudo aquilo que tem em mãos sem deixar sua principal característica de lado: Humanização. Se as histórias de Niki e James estão impecáveis no quesito fidelidade, muito se deve ao diretor, assim como as cenas filmadas dentro das pistas. A opção por não utilizar tanto efeitos especiais, manter os carros em velocidade visível e o enfoque das cenas muitas vezes por meio dos capacetes e olhares dos pilotos é muito positiva em matéria de dinamismo. Para quem não gosta do esporte, a ideia de ver carros correndo em circuitos fechados pode parecer um tanto quanto sem graça, mas Howard soube muito bem como transmitir a emoção dos pilotos aos espectadores, que sentiam na pele a sensação de risco e a consciência do piloto de que qualquer erro de cálculo poderia ser fatal.
Outro ponto forte da trama é a fidelização de certo aspectos. Um dos principais é o uso dos idiomas locais nas cenas em que acontecem em diversos circuitos da F1. Por exemplo, o locutor do autódromo de Interlagos no GP do Brasil em que o mesmo anuncia a corrida em português, ou até mesmo a coletiva de apresentação de Niki Lauda na Ferrari, conduzida em italiano. Além de impressionar ao usar os mesmos carros (alugados de colecionadores), macacões e até mesmo os patrocinadores da época.
A linha tênue entre o que é real e o que não é, existe. A preocupação em romantizar a rivalidade entre acontecimentos e diálogos marcantes sem interferir no resultado final é a mesma de não deixa a trama como um documentário ou uma mera retração. A perfeição com que as cenas principais são feitas é impressionante, vide a do acidente de Niki Lauda em Nurburgring, essa que quase acabou com sua carreira e foi determinante para o título conquistado por James Hunt (Não é spoiler, é história). A reconstrução tanto da cena do acidente, quanto de sua recuperação é forte, impactante e muito emocionante.
Um personagem completa o outro para que a rivalidade ganhe vida. O piloto talentoso que dirige de maneira responsável contra o ousado e conhecido por ultrapassagens perigosas vivendo no limite. Esse equilíbrio ainda mostra que, por mais diferentes que sejam seus objetivos são os mesmos, mas por motivos distintos, e que cada um deseja ter a vida do outro.
Porém, essa perfeição toda não seria possível sem a atuação dos protagonistas. Chris Hemsworth interpreta Hunt de maneira convincente e capta a essência do piloto mais sem noção da história. O espectador consegue ver sua evolução ao longo da trama, passando de um sujeito fanfarrão e abalado psicologicamente pela rivalidade com Lauda, para se tornar uma fortaleza tanto nas pistas, quanto fora dela.
Mas o destaque maior vai para Daniel Brühl na pele do austríaco Niki Lauda. Sua atuação está impecável e sua caracterização fantástica. Interpretar Lauda é uma tarefa dificílima. Sua frieza e sinceridade dita por um sotaque forte é um verdadeiro desafio para qualquer ator, mas Daniel soube fazer com maestria, que até mesmo o próprio piloto reconheceu a semelhança. Brühl sabe fazer tudo aquilo que o público espera que ele faça em seu papel e não será surpresa alguma se acontecer ao menos uma indicação ao Oscar.
Rush - No Limite da Emoção tem tudo para ser filme do ano e é muito mais que uma película sobre Formula Um, é sobre paixão e sobre quais os motivos de cada um na busca pela perfeição, seja ela no esporte ou na vida. Se você é fã de automobilismo, prepare-se para se emocionar a cada minuto da trama. Se não, seja bem-vindo ao mundo de gigantes em que a perfeição é apenas o mínimo de exigência para esses homens, que buscam a glória arriscando suas vidas nas pistas. Coisa de cinema.
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