Colegas


É muito comum a deficiência - independente de qual for - ser retratada nos cinemas. Temos inúmeros exemplos de filmes com a deficiência como tema principal, onde mostram todas as batalhas diárias, dramas da doença e até as dificuldades em relação ao preconceito que sofrem. Mas o diretor brasileiro, Marcelo Galvão chega com um filme disposto a quebrar todos os tipos de paradigmas e nos encantar com uma fábula de dar orgulho ao cinema do nosso país.

Narrado por Lima Duarte, Colegas conta a história de três pessoas portadoras de Síndrome de Down. Stallone, Aninha e Marcio vivem em um instituto para crianças iguais a eles. Até que um dia, Stallone - amante de cinema -, inspirado pelo filme Thelma & Louise, decide fugir em um conversível do dono do instituto, junto a seus colegas para uma aventura na estrada, assaltando restaurantes, a fim de realizarem seus maiores sonhos: Stallone quer ver o mar, Aninha quer se casar e Marcio quer voar.

A direção de Marcelo Galvão é segura e o roteiro nos faz lembrar claramente um filme de Wes Anderson: Um clima leve, divertido, cheio de cores e com um toque lúdico, mas sem se perder na fantasia. O diretor acertou em cheio em colocar o Síndrome de Down apenas como pano de fundo, fazendo uma comédia road-movie auto-depreciativa repleta de referências aos clássicos de Hollywood, como “Cães de Aluguel”, “007”, “Piscose”, “Blade Runner”, “Titanic”, “Pulp Fiction”, e até os brasileiros “Tropa de Elite” e “Cidade de Deus” entram na dança.


Quando vi o trailer do filme pela primeira vez, logo pensei que o diretor teria que ter muita coragem em fazer um filme desses sem sofrer retaliações, afinal, o mundo hoje implica com qualquer tipo de piadinha ou sátira envolvendo assuntos delicados. E em momento algum, o filme busca se aproximar do politicamente correto, e é aí que está toda a força dele. Não nos emocionamos devido às suas deficiências, já que o roteiro utiliza o humor para retratá-las, mas pela história de cada um, por seus sonhos, esses que não que é preciso ter algum tipo de problema para ter. Quantas pessoas não sonham em ver o mar?

Os três protagonistas Ariel Goldenberg (Stallone), Rita Pokk (Aninha) e Breno Viola (Marcio) executam seus papeis com muita qualidade. Breno é o responsável pelas piadas e diálogos mais engraçados, já Ariel e Rita - casados na vida real - mostram uma química perfeita no filme, essa que dá o tom romântico que obviamente não poderia faltar. Já o restante do elenco, apesar de atores globais, viram meros coadjuvantes e pouco importam ao filme. O restante do elenco com Síndrome de Down mostra toda sua força em uma cena onde os dois atrapalhados policiais responsáveis pelo caso os interrogam, todos eles aparecem em cenas hilárias e arrancam risadas de toda a platéia.

E se o roteiro, as atuações, o cenário e a direção estão em perfeita sintonia, a trilha sonora completa com maestria o conjunto da obra. Raul Seixas é o maior ídolos dos três viajantes e compõe boa parte da trilha, com direito a até uma versão de Asa Branca cantada por Raul em inglês. A homenagem ao nosso eterno maluco beleza não fica só na trilha, o músico também faz parte da história e do desfecho da trama. Pra quem é fã do cantor, fica aí uma atração a mais.

Divertido, engraçado e emocionante, Colegas é um dos maiores trunfos da comédia brasileira nos últimos tempos, que foge da rotina e nos apresenta uma perspectiva de cinema completamente diferente. Marcelo Galvão não só faz um filme poético utilizando a deficiência como ponto de partida, como também faz uma singela homenagem ao cinema, que mais uma vez nos mostra uma de suas maiores virtudes, a inclusão.

Nota:

Nenhum comentário

‹‹ Postagem mais recente Postagem mais antiga ››

Postagens populares