Faroeste Caboclo


Quando era mais novo, sempre que ouvia Faroeste Caboclo imaginava o quão seria legal se fizessem uma adaptação da música para o cinema e tentava ilustrar as cenas em cada trecho, acreditando que seria uma ótima base de roteiro. Alguns anos depois, houve a confirmação de que a canção seria adaptada para as telonas, depois de muito tentar imaginar, sabia que aquilo seria um desafio enorme para qualquer um que encostasse no projeto.

Depois de toda expectativa, finalmente a estreia, e posso lhes dizer que não é nem metade do que eu imaginei, melhor assim.


Faroeste Caboclo - adaptação da música de mesmo nome composta por Renato Russo -  retrata a história de João de Santo Cristo, homem de passado pobre que viaja à Brasilia para buscar um algo a mais em sua vida. Lá, João encontra seu primo Pablo, que o coloca em seus negócios relacionados a trafico de drogas e abrindo concorrência ao traficante playboy, Jeremias. Entre disputas de territórios e tiroteios, João encontra Maria Lúcia, garota pela qual se apaixona e passa a ser a vertente de toda sua história.

René Sampaio foi quem aceitou o desafio de transformar a canção em filme, e nos apresentou um resultado no mínimo interessante. O diretor optou por não santificar o protagonista, mas torná-lo um anti-herói desconhecido, o que potencializa a história do mesmo. João não quer falar com o presidente para ajudar toda essa gente que só faz sofrer, ele é só um homem que toma suas próprias decisões decorrentes dos acontecimentos de sua vida, não há um objetivo politico, muito menos social na trama, o que a torna mais simples.

O ritmo do filme começa de maneira lenta, mas muito desse efeito se deve ao espectador, que procura acompanhar as cenas conforme a letra, porém, há um certo ponto em que o storyline se separa da mesma e o público passa a assisti-lo como um filme propriamente dito.

Esse é outro acerto do diretor, que procurou não seguir a canção à risca, mas utilizá-la como base no roteiro, não o tornando uma espécie de vídeo-clipe. Muita coisa da letra está lá, mas alguns fãs torcerão o nariz pelo fato da trama não ser completamente fiel. Podemos considerar esse tipo de adaptação parecida com a de um livro, onde muito material bom é descartado por questões de coesão, e, tendo em vista que a letra é cheia de trechos interpretativos, o roteiro acerta e preenche todas as lacunas de maneira simples e muito bem explicada.

A qualidade do filme, porém, não fica apenas em seu roteiro bem estruturado. As cenas são muito bem produzidas, principalmente as de ação, que são claramente inspiradas em clássicos de Hollywood. Um destaque maior para a cena do duelo final entre João de Santo Cristo e Jeremias, Sergio Leone puro.

Apesar do filme não apresentar nenhum dado de época, a trilha sonora caracteriza a cena brasiliense em seu período dos anos 80, passando por referências internacionais como Sex Pistols e Billy Idol e nacionais como Plebe Rude, banda local da época.

Fabrício Boliveira interpreta João de Santo Cristo com maestria e transmite toda a frieza do anti-herói de forma categórica. Junto a Fabrício, estão Felipe Abib e Ísis Valverde nos papéis de Jeremias e Maria Lúcia respectivamente. A química que envolve o triangulo amoroso é eficaz e muito bem encenada, os três são ligados direta e indiretamente ao outro, o acerto na escolha dos atores foi precisa. Já o restante, não deixam a desejar e compõem o elenco de maneira simples.

Apesar dos elogios, existem sim algumas pontas soltas deixadas no filme, como é o caso de dois personagens especificamente:
 Antonio Calloni, personagem que participa dos negócios de Jeremias, é policial mas exerce pouco essa função. Foi um personagem inserido sem mais, nem menos e pouco mostra qual a sua verdadeira função, um personagem desconexo. Já o outro personagem é o pai de Maria Lúcia, interpretado pelo já falecido Marcos Paulo. Até é compreensível que o intuito seja colocar a mocinha como garota de classe média, o que não fica entendido é o porque do pai dela ser senador. A única resposta para a inserção dos dois, é o fato de tentar impor ao menos algumas questões sociais, principalmente por se tratar de Brasília.

Ao ponto de vista de fã, poderia dizer que Faroeste Caboclo deixa muito a desejar, mas como meu lado cinéfilo fala mais alto, recomendo que até mesmo os fãs deixem a música de lado e aproveitem o filme. Se fizerem isso, vão se deparar com um verdadeiro western tupiniquim cheio de referencias, além de apreciarem uma boa evolução do cinema brasileiro.



Nota:

Nenhum comentário

‹‹ Postagem mais recente Postagem mais antiga ››

Postagens populares